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Mulheres privadas de liberdade recebem certificação em curso de artesanato em Orizona

Mulheres privadas de liberdade recebem certificação em curso de artesanato em Orizona
Mulheres privadas de liberdade recebem certificação em curso de artesanato em Orizona

No dia 13 de agosto, o ambiente da Agência Prisional Regional de Orizona (GO) será tomado por emoção, reconhecimento e dignidade: 20 mulheres em situação de cárcere receberão seus certificados de conclusão de curso em artesanato, marcando o encerramento da primeira etapa de um projeto transformador desenvolvido pelo Ponto de Cultura Encenarte, com coordenação e apoio da Skambau Produções e da Associação dos Artesãos de Orizona (ASDAO).

Este momento representa a força da educação não formal e da cultura como instrumentos de recomeço e reconstrução de vidas. O curso de 120 horas, realizado de março a dezembro de 2024 — contemplado pela Lei Paulo Gustavo em Goiás — oferece às participantes qualificação profissional, estímulo à autonomia econômica e fortalecimento da identidade por meio da arte.

Além das 20 mulheres certificadas, outras 27 seguem em formação, em uma jornada que segue até o fim de 2025. As oficinas são realizadas semanalmente desde 2024 e conduzidas pela artesã Maria Isabel, com apoio das assistentes Mariane Pereira e Nataly Pereira, reunindo técnicas de artesanato com matérias-primas do Cerrado — como cabaças, sementes e folhas secas — e integrando conhecimento técnico, escuta ativa, autoestima e oportunidade de futuro.

“Este momento é o reconhecimento de que cada mulher ali aprendeu, superou desafios e redescobriu talentos. É emocionante ver como a arte pode abrir caminhos e dar novo sentido para histórias que pareciam interrompidas”, afirma Manoela Barbosa, fundadora da Skambau Produções, historiadora e doutora em Ciências Ambientais.

A iniciativa contribui diretamente para a remissão de pena, conforme previsto no Artigo 126 da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984), que permite a redução do tempo de reclusão por meio da participação em atividades educacionais ou laborais. Cada 12 horas de atividade artesanal e educativa desenvolvida ao longo do curso pode ser contabilizada para a remissão de um dia de pena, segundo a normativa vigente.

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Em um país onde menos de 10% das mulheres encarceradas têm acesso a cursos profissionalizantes, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ações como esta são urgentes e exemplares. A maioria das mulheres presas no Brasil está reclusa por crimes não violentos, relacionados ao tráfico ou à pobreza, vive em condições de vulnerabilidade extrema e mais de 60% são negras e de baixa escolaridade, conforme o relatório INFOPEN Mulheres (2023).

Diversos estudos demonstram que o acesso à educação, cultura e trabalho reduz significativamente a reincidência criminal, além de melhorar os indicadores de saúde mental e autoestima. Desse modo, o projeto também valoriza os saberes locais e contribui para políticas públicas intersetoriais que unem cultura, justiça, assistência social e cidadania, provando que a arte é uma ferramenta real de transformação e reinserção social.

“Quando iniciamos as aulas, nosso objetivo era contribuir com a qualificação profissional das mulheres através da criação de peças artesanais. Com os nossos encontros, aprendemos juntas e todas nós criamos uma nova perspectiva de vida. Mulheres que antes não viam alternativas agora pensam em empreender, seguir aprendendo, conquistar sua independência após o cumprimento da pena”, relata Maria Isabel, instrutora de artesanato e coordenadora local do projeto.

Além do impacto psicológico e emocional, a formação em artesanato também estimula o empreendedorismo feminino, com potencial real de geração de renda pós-pena. As participantes aprendem desde técnicas tradicionais até noções de acabamento, identidade visual e precificação, o que amplia suas possibilidades de reinserção no mercado de trabalho ou em redes de economia solidária.

Recomeços

A arte que nasce nas celas é também um elo com a cultura local. As peças produzidas resgatam saberes do território, celebram a força criativa do Cerrado e reafirmam que cada mulher tem história, potência e futuro. Essa vivência, segundo a equipe do Encenarte, transforma o cárcere em espaço de cuidado e resgate da dignidade humana.

Mesmo com limitações de segurança, a expectativa da equipe é registrar a entrega dos certificados e colher depoimentos em áudio das alunas, preservando suas vozes e histórias para futuras ações de memória e sensibilização. A presença de veículos de comunicação dependerá de autorização da Polícia Penal.

Com a realização do curso na edição 2025, o Ponto de Cultura Encenarte reafirma seu compromisso de levar formação, cultura e cidadania a públicos historicamente marginalizados, apostando no protagonismo feminino e na força coletiva de transformação.


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Altair Tavares

Editor do Ciberjornal que sucedeu desde fevereiro de 2025 todo o conteúdo do blog www.altairtavares.com.br . Atuante no webjornalismo desde 2000. Repórter, comentarista e analista de política. Perfil nas redes sociais: @altairtavares