Opinião
Publicado em • atualizado em 05/08/2023 às 19:31

Perdas de R$ 4 bilhões com novas regras em sites de jogos – quer apostar?

Sites de jogos de apostas esportivas sob risco de perda de receita (Foto: Reprodução)
Sites de jogos de apostas esportivas sob risco de perda de receita (Foto: Reprodução)

Os sites de apostas online são uma forma de entretenimento e diversão para muitas pessoas que gostam de acompanhar e palpitar sobre eventos esportivos. No entanto, essa atividade também envolve questões legais, regulatórias e tributárias que afetam tanto as empresas que oferecem os serviços quanto os apostadores que participam dos jogos.

Pelas estimativas atuais, o mercado de apostas online no Brasil deve alcançar R$ 12 bilhões em 2023 – um mercado significativo, considerando o potencial de arrecadação imediata.

Aqui as apostas esportivas foram legalizadas em 2018, mas ainda não foram regulamentadas. Isso significa que não há regras claras sobre como esses sites devem operar, quais são os direitos e deveres dos usuários e como o Estado deve fiscalizar e arrecadar impostos sobre essa atividade.

No entanto, isso vai mudar em breve. O fisco está preparando uma medida provisória que vai estabelecer as normas para a tributação dos sites. A proposta faz parte de um pacote de medidas do Ministério da Fazenda que visa aumentar a arrecadação em até R$ 150 bilhões e sustentar as metas do novo arcabouço fiscal, que vai substituir o teto de gastos públicos.

A nova regra estudada pelo governo brasileiro

Segundo o Ministério da Fazenda, a medida provisória deve ser assinada ainda neste mês e vai definir os seguintes pontos:

  • As empresas que quiserem atuar como sites de aposta online no Brasil precisarão de um credenciamento no ministério da Fazenda, ter sede no Brasil, um capital mínimo de R$ 100 mil, manter diversos certificados sobre os meios de pagamento e pagar uma outorga inicial de R$ 30 milhões à União.
  • As empresas serão taxadas em 15% sobre a receita líquida dos jogos, que é o valor total das apostas menos a premiação aos vencedores.
  • As empresas também terão que repassar porcentagens extras sobre a receita líquida para setores específicos: 2,55% para o Fundo Nacional de Segurança Pública; 0,82% para a educação pública; 1,63% para entidades esportivas e atletas que cedem direitos de imagem (totalizando 5% adicionais).
  • As empresas ainda estarão sujeitas ao pagamento de impostos usuais incidentes sobre o funcionamento de empresas no país, como adicional sobre IRPJ (quando o lucro ultrapassa R$ 20 mil no mês), PIS/Cofins e CSLL.
  • Os apostadores serão taxados em 30% sobre os valores dos prêmios recebidos durante um evento esportivo. Haverá isenção para ganhos que fiquem dentro do valor da primeira faixa livre de Imposto de Renda, atualmente em R$ 1.903,98.
  • Quem descumprir essas regras será multado, tanto a empresa que oferecer serviços a clientes brasileiros quanto os apostadores que atuarem nesses serviços.
  • A propaganda dos sites de apostas online também será regulada pelo Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), que vai definir horários, temáticas e termos permitidos e proibidos para esse tipo de serviço. Os sites sem credenciamento estarão impedidos de fazer propaganda em território nacional.
  • Alíquotas e exigências de registro

As alíquotas propostas pelo governo federal são consideradas altas por especialistas e empresários do setor. Eles argumentam que isso pode inviabilizar a operação das empresas no Brasil e estimular a ilegalidade e a evasão fiscal. Porém, se considerarmos o cenário atual onde praticamente 90% do faturamento das plataformas não é apresentado a tributação devidamente – sem dúvida a regulação vai causar impactos consideráveis nos ganhos.

Por outro lado, o governo defende que as alíquotas são compatíveis com as praticadas em outros países que regulamentaram as apostas esportivas online. Segundo estudos do fisco, a arrecadação pode variar entre R$ 2 a R$ 8 bilhões diante da nova regra.

Segundo o Ministério da Fazenda, a fiscalização será feita por meio de um sistema informatizado que vai monitorar as operações realizadas pelos sites credenciados e pelos apostadores. O sistema também vai permitir o controle dos repasses das empresas para os setores beneficiados pela lei e para o pagamento dos impostos.

Além disso, o governo pretende coibir a atuação dos sites ilegais que não se adequarem às novas regras. Para isso, vai contar com a colaboração das instituições financeiras, das operadoras de cartão de crédito e dos provedores de internet, que poderão bloquear as transações e o acesso a esses sites.

A regulamentação não incluiu, até o momento, previsões sobre uso de criptomoedas nas apostas – mas com a vinculação dos bancos, meios de pagamento e de cartões – dificilmente conseguirão escapar dos holofotes do fisco quaisquer operações que envolvam brasileiros. Além disso, o envio das declarações eletrônicas a que as empresas estarão sujeitas facilitarão o big brother tributário sobre as movimentações.

O impacto nos ganhos das plataformas nos próximos anos

A tributação dos sites no Brasil pode ter um impacto significativo nos ganhos das plataformas e dos apostadores caso essa regulamentação seja implementada. Estimativas conservadoras nos levam ao seguinte cenário de impacto financeiro entre 2024 e 2028:

  • o faturamento das plataformas no Brasil deve crescer 10% ao ano nos próximos 60 meses, mantendo a média histórica do setor;
  • a margem de lucro líquido se manterá em 10% ao ano no mesmo período, sem alterações significativas;
  • quanto a demanda de consumidores, estima-se que não haverá impacto relevante na concorrência, nos custos operacionais atuais e nos impostos para o quinquênio;
  • na estimativa, considera-se que as plataformas têm capacidade de caixa atual para desembolsar o valor da “licença” de R$ 30 milhões para operação;
  • consideramos um lucro líquido de R$ 500 milhões por ano para as plataformas com um impacto de 131,5% sobre o lucro;
  • consideramos ainda:
  • a tributação federal das plataformas provavelmente será no Lucro Real, em razão das faixa de faturamento (não conseguirão aderir ao Simples ou Lucro Presumido);
  • alíquotas de adicional de IRPJ de 10%, PIS/COFINS de 9,25% e CSLL de 9%;
  • imposto municipal ISSQN da atividade, com alíquota média de 4%;
  • além dos impostos federais, foram consideradas sobre a receita líquida dos sites de apostas as alíquotas de 2,55% para o FNSP, 0,82% para a educação, 1,63% para entidades esportivas e atletas;

Para as plataformas, o impacto pode ser positivo ou negativo, dependendo da capacidade de adaptação ao novo cenário. Por um lado, elas podem se beneficiar da maior segurança jurídica, da maior confiança dos usuários e da maior demanda pelo serviço. Por outro lado, elas podem ter que enfrentar uma maior concorrência, uma maior carga tributária e uma maior burocracia.

Para os apostadores, dependendo do perfil e do comportamento do usuário, pode ser bastante negativa. Eles podem ter que pagar altos impostos sobre os prêmios recebidos e ter menos opções de sites para escolher (apenas os licenciados). Por outro lado, podem ter mais garantias sobre a legalidade, a transparência e a segurança das operações e dos pagamentos (mas consequentemente serão muito mais monitorados em suas declarações de IR).

Conclusão – façam suas apostas!

Os sites de apostas online no Brasil estão prestes a passar por uma grande mudança com a proposta de tributação do governo federal. A medida visa aumentar a arrecadação, regularizar o setor e combater a ilegalidade. No entanto, ela também pode gerar impactos nos ganhos das plataformas e dos apostadores. Por isso, é importante que as partes interessadas acompanhem o processo legislativo e já se preparem para as novas regras.

Estruturas empresariais nacionais e internacionais já precisam ser consideradas, bem como as estratégias tributárias internas e a apropriação de despesas incidentes sobre toda a operação, incluindo as taxas de operação diárias, câmbios, equipes de compliance e política de proteção de dados (LGPD e combate à lavagem de dinheiro).

Alinhar a operação a uma orientação contábil e tributária estruturadas, baseadas na legalidade e nas opções disponíveis na legislação para buscar o máximo de rentabilidade sem deixar de atender as exigências fiscais e às informações de cruzamento digital. Afinal, quando o fisco começa a regulamentar um determinado setor, todo cuidado é pouco para que a burocracia não seja a principal causa para inviabilizar as operações empresariais.

Já para os apostadores, uma tributação de 30% direta sobre ganhos é bastante agressiva, para não utilizar outro termo. Contudo, pode ser que com essa abertura, muito do preconceito que o mercado e o fisco possuem com este potencial setor da economia deixe de ser um entrave ao seu crescimento e sua plena operação no país.

Enquanto aguardamos – façam suas apostas – pois os resultados ainda são incertos!

Membro permanente da Comissão de Privacidade, Proteção de Dados e Inteligência Artificial da OAB/SP. Autor do Livro "Dinheiro da Multidão”.

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